Informação sobre a Crise Alimentar no Corno de África
O Corno de África está a braços com uma enorme crise alimentar, com milhões de pessoas severamente afectadas por uma seca que fustiga a Somália, o Quénia, a Etiópia, o Djibuti e o Uganda.
Em Julho, as Nações Unidas declararam as regiões de Bakool e Lower Shabelle, no sul da Somália, zonas de fome, mas outras regiões do país enfrentam uma acentuada escassez de alimentos.
Qual o número de pessoas afectadas?
As Nações Unidas apontam para 10.7 milhões pessoas a necessitar de ajuda humanitária na Somália, Quénia, Etiópia, Djibuti e Uganda. Este valor representa um aumento de 30% face ao início do ano.
Estima-se que o número de pessoas afectadas irá aumentar à medida que os efeitos da seca corroem a capacidade das pessoas lhe resistirem. As Nações Unidas não prevêem melhorias para o próximo ano.
Nos últimos cinco anos, o corno de África sofreu duas crises de fome. Em 2006, cerca de 11 milhões de pessoas foram duramente atingidas pela seca (que atravessou toda a África e para a qual a Cáritas Portuguesa apoiou uma acção da Cáritas de Cabo Verde) e em 2008-2009, o número de pessoas afectadas chegou aos 20 milhões.
Em 1984-5, secas, fome e conflitos na Etiópia mataram quase 1 milhão de pessoas.
Esta é a pior seca dos últimos 60 anos?
Alguns meios de comunicação social, incluindo a BBC, e algumas agências humanitárias, têm descrito esta seca como a pior nos últimos 60 ano. Apesar de esta apreciação não ser consensual, esta é, sem dúvida, uma das situações mais graves dos últimos anos, principalmente porque o seu impacto nas populações tem sido empolado pelo preço extremamente alto dos alimentos e por respostas humanitárias limitadas .
Como é que esta seca se transformou numa emergência?
Numa região em que a água é escassa, a falta de chuva provoca más colheitas, o que, por sua vez, provoca escassez de alimentos. Muitas comunidades vivem da pastorícia mas o gado está a morrer por falta de água e pasto. A inflação dos preços, superior a 20%, em grande parte da África Oriental, colocou muitos alimentos fora do alcance das camadas mais pobres da população.
Há vários anos que a Somália vive numa situação de conflito o que tem limitado a ajuda humanitária, especialmente no sul, que é controlado por movimentos islâmicos que se opõem ao regime.
A falta de alimentos obrigou dezenas de milhares de somalis a empreender longas viagens para campos que estão além-fronteiras, principalmente no Quénia e na Etiópia. No início de 2011, a assistência humanitária abrangia 850 mil somalis e, actualmente, passou a abranger 2.850.000, ou seja, um terço da população da Somália (a Somália tem cerca de 9 milhões de habitantes).
Apesar dos inúmeros programas de desenvolvimento e das intervenções de emergência, que se têm implementado nos últimos anos no Leste Africano, têm sucedido diversas crises alimentares. A UNICEF dá conta de que as pessoas estão conscientes dos ciclos de seca mas os efeitos são sempre uma incógnita. “Os sistemas de alerta têm melhorado, muitos projectos têm ajudado as comunidades a melhorar as suas práticas de gestão da água e de alimentos e até se tem registado progressos, apesar de ténues, no estado nutricional das crianças mas o impacto desta seca, que se tem intensificado nos últimos meses, e a crise dos refugiados somalis, têm afectado as populações muito mais do que se poderia prever ”.
Onde é que a crise é pior?
Em Junho, as Nações Unidas divulgaram um relatório no qual identificam a necessidade de ajuda da humanitária da seguinte forma: Quénia 3,5 milhões de pessoas, Etiópia 3,2 milhões de pessoas, Somália 2.850.000 pessoas, Uganda 600.000 pessoas e Djibuti 120.000 pessoas. Não estão disponíveis dados sobre a Eritreia, mas acredita-se que também seja um dos países afectados. Apesar dos totais, os dados não constituem um ranking da crise pois a situação varia entre, e dentro, dos países.
Por exemplo, as condições registadas nas regiões fronteiriças do Quénia e da Etiópia, com a Somália, são particularmente más pois estas são o destino de milhares de somalis famintos que caminham duas a três semanas, em média, e acabam por chegar a campos de refugiados superlotados. Entre 30% e 50% das crianças que ali chegam estão seriamente subnutridas.
A UNICEF acredita que no leste da Etiópia, em geral, ainda não se alcançou o “ponto de inflexão”, e há um certo de optimismo de que uma “crise ainda maior” pode ser evitada se os doadores responderem aos apelos de emergência e se houver ajuda alimentar suficiente para ser entregue.
No Quénia e na Somália, a escassez de alimentos já atingiu a fase de emergência, embora o prognóstico para cada país seja diferente. No Quénia, o governo declarou uma situação de emergência nacional e comprometeu-se a aumentar a importação de cereais, o que poderá reduzir o impacto. Mas na Somália, o conflito levanta um ponto de interrogação sobre a capacidade das agências humanitárias poderem responder. No início de Julho, a al Shabaab – grupo rebelde que controla grandes áreas do país – autorizou o trabalho às agências de ajuda humanitária por causa da seca. A comunidade internacional saudou esta decisão mas permanece preocupada com a segurança local.
A seca pode levar à fome?
A Rede dos Sistemas de Aviso Prévio contra a Fome estima que, entre Julho e Setembro, o nordeste do Quénia, o sudeste da Etiópia e partes da Somália – principalmente centro e Sul vão permanecer como zonas classificadas como “emergência de insegurança alimentar”, que é a fase que antecede a classificação de “Catástrofe de fome”
Para o Corno de África, não se prevê chuva até Outubro, mês que assinala o início da época das chuvas. A causa da seca, que apesar de cíclica tem sido mais severa desde o último trimestre de 2010, tem sido associada ao fenómeno La Nina – temperatura do oceano pacífico invulgarmente fria. Mas ainda é cedo para fazer uma avaliação do impacto que se poderá esperar para o último trimestre de 2011 .
Quanto dinheiro é necessário para responder a esta situação?
A UNICEF precisa de 75 milhões de dólares, 32 milhões a serem aplicados nos próximos 3 meses, para aplicar em alimentação, água e cuidados de saúde na Somália, Quénia e Etiópia.
O ACNUR fez um apelo no valor de 136 milhões de dólares para apoiar os refugiados somalis nos campos de deslocados.
Existem ainda apelos individuais para o Quénia (605 milhões de dólares) e para a Somália (561 milhões de dólares) que já conseguiram cerca de metade da verba solicitada. O Governo Etíope está a fazer uma avaliação das necessidades. Até agora, as agências da ONU e seus parceiros de ONG não emitiram um apelo conjunto para a emergência cobrindo toda a região.
A cobertura mediática tem ajudado na sensibilização dos países doadores e há a expectativa de que as verbas sejam disponibilizadas rapidamente a mas a UNICEF prevê que não se verifiquem melhorias significativas até ao final do ano.
O Programa Alimentar Mundial (PAM) está fornecer assistência alimentar a 6 milhões de pessoas na Etiópia, Somália, Quénia, Djibuti e leste de Uganda, mas com o aumento do impacto da seca espera que este número irá aumentar. O PAM estima que precisará de cerca de 477 milhões de dólares para atender às necessidades da fome na região até o final do ano mas, até ao momento só conseguiu 40% desta verba, cerca de 190 milhões de dólares.
Hoje, dia 18 de Agosto, está a decorrer uma reunião na FAO para reunir outros apoios financeiros.
O que está a fazer a rede Cáritas?
Muitas Cáritas que trabalham nos países afectados estão a ajudar as pessoas através de alimentos, de assistência médica, de água potável, do fornecimento de comida e água para os animais de pastorícia, ou ajudando as pessoas a vender os animais que não têm possibilidade de criar. Pretende-se melhorar a resiliência das comunidades ao efeito da seca.
A Caritas da Somália apoia com ajuda alimentar 7.000 pessoas, através de Operação Lifeline. Destas, 1400 são crianças e idosos. A Cáritas da Somália prevê alargar este apoio a mais 4000 pessoas.
As Caritas da Suíça e do Luxemburgo estão a providenciar água potável a 70 mil pessoas seminómadas, no leste da Somália.
No Quénia, a Cáritas nacional diz que os índices de desnutrição, particularmente para as crianças, são críticos, o gado está a morrer devido à falta de água e começam a ocorrer surtos de cólera, em algumas partes do país, onde a água é escassa. Neste país, em particular no leste, no vale do Rift, a rede Cáritas fornece ajuda alimentar a 40 mil pessoas. Está, ainda, em curso um programa veterinário para salvar 15 mil bovinos.
A Cáritas da Etiópia distribui alimentos a 80.000 pessoas em Haraghe e Meki. Na região sul, em Borana, estão, também, a ser implementados programas de apoio ao gado permitindo a 25.000 famílias manter a saúde do seu gado.
As delegações da Caritas Internationalis em Genebra e Nova-York estão a acompanhar de perto a situação e fornecer informações actualizadas às agências especializadas das Nações Unidas envolvidas (ACNUR, FAO, PAM, UNICEF e outros).
8 Factos sobre a Fome
1. 925 milhões de pessoas vão, todas as noites, para a cama com fome – este número é superior à soma da população dos Estados Unidos, Canadá e União Europeia (FAO)
2. A cada seis segundos, uma criança morre de fome (PAM)
3. Um quarto das crianças nos países em desenvolvimento tem peso inferior ao normal (FAO)
4. Três quartos das pessoas com fome vivem em zonas rurais (FAO)
5. Das dez situações de fome mais dramáticas do século 20, nenhuma aconteceu em África. As mais mortíferas ocorreram na China, na União Soviética, na Coreia do Norte e na Índia.
6. Desde a independência que a Índia tem conseguido evitar a fome mas, de acordo com o PNUD, 267 milhões indianos ainda vivem com fome crónica – mais do que em toda a África subsaariana (FAO)
7. O maior doador do mundo, os Estados Unidos, fornece a maioria da sua ajuda alimentar adquirindo-a aos agricultores Americanos e enviando-a, através de embarcações para as regiões afectadas.
8.Apenas uma fracção da ajuda alimentar mundial é utilizada no combate à fome severa. A sua maioria destina-se às populações envolvidas em catástrofes naturais ou conflitos, ou que vivem em lugares onde a pobreza é endémica.