Abel Varzim, o roteiro da luta contra o flagelo da prostituição
Este foi o denominador comum às quatro intervenções que marcaram na passada terça-feira, 9 de Junho, na Feira do Livro, em Lisboa, a apresentação da reedição da obra “Procissão dos Passos- Uma vivência no Bairro Alto”, do padre Abel Varzim. Uma iniciativa da Editorial Cáritas em parceria com a Paulus Editora inserida nas comemorações que o Fórum Abel Varzim está a desenvolver um pouco por todo o país para assinalar os 50 anos da morte do padre que em meados do século XX lutou contra a exclusão social.
Um livro que retrata a realidade social do Bairro Alto numa época de profundos contrastes e assimetrias na Lisboa que o padre Abel Varzim conheceu e onde a prostituição vivia lado a lado com uma elite social que a atirava “para as margens da sociedade”, como sublinhou nesta sessão o presidente da Cáritas Portuguesa. Para Eugénio da Fonseca“ é preciso lutar contra esta indignidade, mulheres que têm de vender o corpo contra a sua própria vontade própria”, uma preocupação sublinhada também pelo presidente do Fórum Abel Varzim, António Soares.
A apresentação mais substantiva desta obra foi feita pelo teólogo e professor da Universidade Católica Juan Ambrósio, que sublinhou o carácter inédito deste texto biográfico, que faz um “exercício de reflexão e meditação sobre a sociedade e a vida à luz da fé deste homem”.
É a descrição de uma procissão, o itinerário de uma “procissão interior que procura conduzir o ser humano à transformação”, explicou Juan Ambrósio que fez neste contexto o enquadramento histórico do livro. Uma obra que remete os leitores para a experiência do padre Abel Varzim, enquanto pároco da Encarnação, no Chiado, junto do mais marginalizados da sociedade de então, muito marcada por mulheres que viviam da prostituição.
Um bairro de “gente de «Bem», íntegra“, que estava ameaçada por estas mulheres “os lobos que atacam o rebanho”, uma expressão da altura lembrada por Juan Ambrósio para sublinhar uma grande prioridade do padre Abel Varzim: Fazer pontes, para evitar que estas mulheres, “as sobras”, fossem marginalizadas.
Para o teólogo português, o padre Abel Varzim “que dava a primazia ao sistema, começou a dar primazia às pessoas por entender que estas mulheres também pertenciam «ao rebanho»”. Daí a o seu protesto e denúncia profética para mudar radicalmente a lógica do sistema de então assente “num assistencialismo que apenas perpetuava a situação, mas não a resolvia”.
E foi neste contexto que a encerrar a apresentação do livro, o prof. Juan Ambrósio lançou quatro grandes critérios a ter em conta para a transformação preconizada pelo padre Abel Varzim: “O bem comum e a justiça social, o cuidado do outro, a ética do «Dom» e da gratuidade, e ainda, a misericórdia, isto é, a caridade”.
“Tudo isto exige a revolução da ternura e do carinho, como diz o «papa Francisco», sublinhou ainda Juan Ambrósio, que do padre Abel Varzim retém a certeza do «Homem que trouxe as margens para o centro», na convicção, profundamente evangélica, de que «é preciso libertar o Homem de todas as cadeias» ”.
Texto do jornalista Domingos Pinto