O futuro do trabalho
Foi este título que Guy Ryder, Diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT), deu ao relatório que apresentou na 104ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho, realizada há dois anos. A preocupação expressa nesse documento continua atual. Por razões inaceitáveis, o trabalho está a ser um bem cada vez mais escasso. O pior é que esta realidade está a ser entendida e aceite como uma quase fatalidade.
Este é um dos aspetos sublinhados no documento tornado público pela Plataforma “Compromisso Social Cristão”, para assinalar o Dia Mundial do Trabalhador. Este grupo, que pela primeira vez reúne todas as organizações da Igreja envolvidas no mundo do trabalho, fala do desemprego como “a maior injustiça que existe no mundo”. Efetivamente é assim que este problema deve ser entendido e é precisamente por esta razão que ele deve ser combatido.
Para além disto, segundo o último estudo, a OIT apresenta uma queda dos rendimentos do trabalho, face ao PIB, de 60% para 52%, entre 2003 e 2015. Em Portugal, entre 2008 e 2015, registou-se a destruição líquida de cerca de 570 mil empregos e aumentaram de cerca de 580 mil os empregos remunerados com o salário mínimo. Atualmente, quase um milhão de portugueses recebe o salário mínimo. É escandaloso o aumento de trabalhadores pobres, que sendo um facto antigo, se agravou, paradoxalmente, nos últimos anos. As relações laborais tronaram-se frágeis, assentando em critérios que estabelecem um referencial de precariedade e que provoca impactos na vida social e familiar. A instabilidade causa desgaste emocional nos trabalhadores e, de forma particular nos jovens; a insegurança obriga a colocar numa espécie de bolha suspensa a vida familiar e pessoal.
Apesar dos bons ventos anunciados e de haver um clima de “pós crise” é preciso manter em linha de atenção que o desemprego vai continuar a cair nos próximos anos. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) aponta para valores que podem chegam aos 10,88% em 2017. Todos os valores podem ter, naturalmente, diferentes leituras. É necessário alertar para as implicações socias destes números. “As relações laborais entre empresas e trabalhadores são precárias, obrigando a um novo entendimento de carreiras, tornando o futuro mais exigente e incerto”, lê-se no texto da Plataforma “Pensamento Social Cristão”, que sublinha: “existem ainda muitas empresas a assumirem, ou a não conseguirem deixar de assumir, os salários baixos dos seus trabalhadores como vantagem competitiva, criando uma geração de trabalhadores, que, mesmo empregados, não conseguem sair da sua situação de pobreza.”
Uma eventual tendência de recuo do desemprego pode significar não um investimento no emprego, mas, sim, um desinvestimento na qualidade desse emprego. Hoje já não pensamos em “empregos para o futuro”, mas será que nos questionamos sobre “que futuro para o emprego?
Texto de Eugénio Fonseca publicado no jornal “Sem Mais”