Cáritas renova a sua posição sobre a austeridade
Numa delaração conjunta a Cáritas Europa e a Cáritas Portuguesa apresentaram hoje publicamente a sua posição sobre avaliação final do programa de ajustamento económico para Portugal. Na sequência do trabalho realizado para a elaboração do segundo relatório europeu de acompanhamento da crise, as duas organizações da Cáritas sublinham a importância de não se olhar para a austeridade como o único caminho para ultrapasar as consequências da crise e evidência a urgência de se olhar para as pessoas acima de todas as coisas atendendo às suas necessidades e à sua situação de fragilidade.
A Cáritas Europa e a Cáritas Portuguesa discordam da declaração emitida pela Troika (FMI, BCE e CE) no dia 02 de maio, por ocasião da avaliação final do programa de ajustamento económico para Portugal. Lembram, aquilo que muitas outras organizações – algumas relacionadas com as instituições representadas na própria Troika – têm vindo a dizer nos últimos tempos:
1. As medidas de austeridade não são a única solução dos problemas causados pela crise.
2. As pessoas que estão a pagar o preço mais elevado da crise são as que nunca foram chamadas a ter intervenção nas decisões que levaram ao aparecimento da crise.
3. Os países onde foram introduzidas medidas de austeridade muito fortes, como por exemplo Portugal, são os mesmos que têm sistemas de proteção social mais débeis, o que levou a um aumento da incapacidade para proteger, socialmente, os seus concidadãos.
Em contraste com o que se descreve como efeitos positivos das medidas impostas à população portuguesa, a Cáritas Europa e a Cáritas Portuguesa desejam chamar a atenção para as evidências que constam no segundo relatório europeu de acompanhamento da crise, realizado sob a coordenação da Cáritas Europa, no qual se evidenciam as nefastas consequências e a ineficácia das medidas de austeridade, na vida das populações já, económica e socialmente, vulneráveis.
O relatório foi elaborado com base na realidade descrita pelas Cáritas dos 7 países europeus mais atingidos, fundamentado na análise de diversas fontes estatísticas oficiais. As evidências fornecidas pelo referido relatório dão à Cáritas a legitimidade para reivindicar que a austeridade, como forma de resolver os problemas causados pela crise, não pode ser a única solução.
Enquanto a Troika elogia Portugal por “ampliar a recuperação económica”, a realidade mostra que, 5 anos depois do início da crise, o crescimento ainda é muito baixo, e que as medidas de austeridade estão a provocar elevados níveis de pobreza. O sistema de proteção social em Portugal está sob grande tensão devido aos sucessivos cortes nos serviços públicos, concretamente, na saúde e na segurança social que estão a afectar, desproporcionalmente, os grupos mais vulneráveis e de rendimentos mais baixos.
Portugal é um dos países onde se registou um dos maiores aumentos do desemprego (juntamente com a Grécia, Espanha, Itália e Irlanda). A Troika fala de recuperação económica e de crescimento no investimento e no consumo privado. Infelizmente, estes não são elementos significativamente suficientes para combater a preocupante taxa de desemprego. É isso que constata a OCDE, ao reconhecer que o desemprego, em Portugal, é cada vez mais estrutural (com metade dos desempregados fora do mercado de trabalho há mais de 1 ano) colocando em causa se Portugal está, realmente, no caminho de uma nova empregabilidade geradora de crescimento económico sustentável.
A Cáritas Europa e a Cáritas Portuguesa concordam com a afirmação de que a aplicação do Programa de Ajustamento definido pelo Governo e pela Troika implicou “sacrifícios aos portugueses”. No entanto, muitos destes sacrifícios não eram “inevitáveis”, como se tem dito.
Os políticos têm opções quando decidem propor, viabilizar, implementar ou simplesmente criticar medidas políticas. O caminho da austeridade escolhido, até agora, não tem sido capaz de atingir os principais objetivos a que se propôs.
Neste momento de saída do Programa de Ajustamento, que saudamos por possibilitar o fim – assim o esperamos – das exigências de sacrifícios tão duras e sempre aos mesmos, a juntar à realização de eleição de novos representantes europeus, a Cáritas Europa e a Cáritas Portuguesa ousam instar o Governo português para que:
1) certifique que os custos da austeridade possam ser partilhados de forma justa e equitativa por toda a sociedade.
2) que quaisquer novas medidas a serem planeadas não introduzam mais cortes nas pensões e nem criem impactos negativos sobre o mercado de trabalho;
3) recoloque as pessoas no centro das suas políticas, agora que o programa de ajustamento chegou ao fim e que o Governo está livre de obrigações tecnocratas e económico-financeiras;
4) garanta, rapidamente, a proteção social dos que estão aprisionados a situações de desemprego de longa duração.
5) aponte para um crescimento económico e coesão social que reflitam as propostas da Cáritas apresentados nos últimos 3 anos.
6) respeite os clamores dos grupos fragilizados da população e leve em consideração todos os atores da sociedade civil que os representam.