Império do medo e do culpado
Ninguém pode saber com certeza como será 2022…
2020 foi um ano duro, 2021 foi ainda mais, mas ensinou-nos (obrigou-nos) a olhar para mais perto e deu-nos uma noção diferente do tempo e do seu uso. No ano que deixámos, vivemos com cores de crise, embrulhados na persistência de uma situação sanitária, económica e social, que bem gostaríamos de deixar para trás… Agarrados a uma esperança de diminuição de “gravosidade” da atual Omicron e a alguns indicadores económicos positivos (ainda esta semana recebemos a boa nova da diminuição da taxa de desemprego), acreditámos que era desta que poderíamos sair deste ciclo cinzento de vidas em suspenso, mas não foi totalmente assim … De repente sentimos que há cada vez mais pessoas infetadas e menos informação. O SNS não colapsa nos hospitais, mas desaba na proximidade e não cumpre a suposta universalidade do direito de acesso à saúde. As linhas não dão resposta, as Unidades de Saúde não conseguem cumprir os procedimentos de acompanhamento para além da resposta automática e as pessoas vivem entre a desconfiança, a inconsciência, a ignorância e um desleixo no cuidar. Assiste-se à vitória do medo e do primado do culpado. As pessoas temem infetar-se e ponderam esconder para que não lhes atribuam a culpa da transmissão. Procuramos cada vez mais o culpado e dedicamos muito pouco a prevenir.
Casa em que não há pão (saúde)… Todos ralham ninguém tem razão.
As crianças vivem uma vida inconstante sem orientação certa do que podem ou não fazer, os jovens anseiam por “re-ganhar” a sua zona pessoal, os adultos vivem dias conflitantes em que, entre a família, a casa, o trabalho e o seu próprio espaço, se sentem sempre em falha, e os idosos cada vez mais isolados, mais sós, menos estimulados e descrentes do devir.
A ansiada retoma económica enfrenta também desafios inesperados. Há um aumento generalizado dos materiais, dos preços e do custo de vida. Há uma enorme dificuldade em encontrar pessoas para preencher a necessidade de RH para profissões auxiliares em todos os setores (educação, saúde, apoio social, áreas indiferenciadas …)… É um enorme “PRECISA-SE DE MÃO-DE-OBRA”.
Durante tempo demais descurou-se o investimento na dignidade no emprego, no primado do mérito, do conhecimento e da competência e no combate à desigualdade social e, agora, a retoma da VIDA tem de ser priorizada, integrando todos os ensinamentos que nos trouxe a pandemia.
Mas também sabemos que há muitos instrumentos que nos serão oferecidos em 2022.
Acredito que a pandemia nos trouxe uma maior maturidade pessoal, funcional e institucional e que teremos:
- um olhar mais estratégico e menos imediatista sobre a saúde
- novos recursos para a inovação e as políticas sociais
- mais visão e maior resiliência
- maior estabilidade governativa para a orientação estratégica, maior centralidade da pessoa para a definição de políticas sociais e a aposta no primado do interesse nacional.
- maior clareza sobre o que cada PARTIDO tem para oferecer ao País, se for possível que estes tempos de preparação para as eleições sejam espaço para apresentação e debate de temas com substância na discussão!
- Novo Orçamento que possa garantir um compromisso plurianual que considere a sustentabilidade dos sistemas prioritários, um Contrato intergeracional, uma nova geração de políticas sociais, de habitação e de saúde e o empenho contratualizado de todos
- Menos pobreza, mais crescimento, menos pandemia, mais empenho nos desafios do clima, menos desigualdade, mais convergência, menos solidão, mais atenção ao papel sócio económico junto das comunidades, grupos e países em situação de calamidade ou conflito, mais reconstrução, menos solidão, maior aposta no conhecimento e empenho… Maior desenvolvimento integral.
- O PRR
Enfim aprender com os erros, usar o tempo e os recursos com propósito, acreditar que podemos fazer a diferença e devemos participar e como gosto de acreditar … esperançar.
Os reis magos já retornam a casa, mas na próxima terça-feira celebra-se o Dia Internacional do Obrigado … Aproveito por isso o mote …
Pela esperança neste novo ano que começa, e porque acredito no papel de cada um de nós num dia melhor, fica o meu agradecimento a todos. Aos que fazem do seu empenho diário uma ferramenta para um mundo melhor e, … desculpem esta nota pessoal, a todos os que são “CARITAS” ou são pedaço e coração da rede Cáritas em Portugal, OBRIGADA!
Rita Valadas
Presidente da Cáritas Portuguesa
(Crónica emitida no domingo, 9 de janeiro de 2022, no espaço “A Opinião”, na TSF