Próximidade
Não há longe nem distância, é muito mais do que o título de um livro de Richard Bach, é um desafio ao valor e importância da proximidade nas dimensões do espaço e do tempo.
Hoje estar próximo tem cores e valores diferentes. A pandemia isolou as pessoas e tornou o próximo, longe. Na relação pessoal a distância viveu-se de maneira diferente, desafiou-nos a encontrar formas de presença diferentes da convivência física e criou estratégias de ligação que creio ser importante preservar.
No mesmo contínuo temporal, a informação explode em todos os meios, mas vive muitas vezes do que se ouve contar e não do que efetivamente acontece. Vivemos o primado da opinião pessoal cientificada e questionamo-nos cada vez mais sobre a certeza e a confiança naquilo que nos chega ao conhecimento, entrando pelos meios digitais e de comunicação.
O livro de Richard Bach, conta uma história de uma pessoa faz uma enorme viagem para poder entregar uma prenda a uma amiga na sua festa de aniversário. Na história, quem se cruza com o narrador não entende porque faz tal viagem só para se fazer presente, questionando se a presença física é mais importante do que estar no coração dos que amamos. A gaivota, companheira de viagem diz “não precisas de prendas de metal ou de vidro para falares da verdade do que sentes. Não precisas de estar ao lado de alguém para o veres crescer, isso não depende de ti. Mas, o que não podes deixar é de partilhar a alegria de viver, essa sim, encurta a distância e faz-te presente.”
Parece assim haver dois espaços para uma verdade. Fazer-se presente não é o mesmo que estar próximo. E pode combater-se a solidão e demonstrar afeto sem estar fisicamente próximo. Hoje, nestes tempos, com as novas tecnologias, podemos reforçar a presença e os elos que nos unem. Há ganhos de cumplicidade, de escuta ativa, de alegria, há reforço da confiança que nos une e da cumplicidade com que olhamos a vida.
Por outro lado, a confiança na verdade da palavra escrita ou gravada exige uma grande ponderação e confirmação.
Ontem a proximidade foi a palavra de ordem do Encontro das Cáritas/Grupos paroquiais. Se é verdade que no mundo dos afetos a presença não é o garante da confiança e da confirmação, para conhecer e agir sobre as situações de pobreza e de vulnerabilidade é cada vez mais óbvio que o mais eficiente é garantir a proximidade.
A existência de grupos de apoio social nas paróquias contribui para que a paróquia seja o radar das vulnerabilidades e a principal ferramenta para as diferentes situações de carência, sobretudo quando em emergência.
Conhecer as situações dos mais frágeis, colaborar para encontrar soluções, encaminhar e acompanhar as pessoas tem um valor na proximidade que não tem na distância.
Ser uma rede que contempla a proximidade das paróquias e a dimensão do mundo é uma enorme riqueza. É estar na porta ao lado e ao mesmo tempo que se está no outro lado do mundo. Como referiu Maria Nyman, Secretária Geral da Cáritas Europa, “o trabalho e o empenho incansáveis a nível nacional, diocesano e paroquial fazem da Cáritas um dos principais atores humanitários e sociais da Europa. Onde há necessidade, há Cáritas. Fazemos parte da Caritas Internationalis, a confederação global da Cáritas. A Cáritas Europa é uma das sete regiões da Caritas Internationalis que engloba 167 membros nacionais e é a 2ª maior organização humanitária do mundo. Garantimos serviços e apoio em cerca de 200 países em todo o mundo. Somos todos parte de uma mesma família Cáritas (…) é uma família muito grande e fantástica. No entanto, a nossa singularidade e riqueza vem realmente do terreno, do trabalho da Cáritas a nível local, a nível paroquial. Isso é o que realmente nos torna uma organização excecional. Somos uma rede de rostos humanos, de pessoas, unindo esforços para trabalhar pelo bem comum.”
É o que sinto hoje. Estou grata por pertencer a uma rede que é proximidade, mas vive no mundo. Que se centra em cada pessoa, mas almeja o desenvolvimento humano integral.
É isso que celebro hoje convidando todos para esta alegria.
Rita Valadas
Presidente da Cáritas Portuguesa
Crónica emitida no domingo, 22 de maio de 2022, no espaço “A Opinião”, na TSF