COM OS POBRES
Conferência Anual da Comissão Nacional Justiça e Paz
(Eugénio Fonseca)
Agradeço à Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP) por envolver também a Cáritas Portuguesa na preparação e concretização desta Conferência para juntos, assinalarmos o Dia Mundial do Pobre que acontece no próximo dia 17 outubro. Compraz-nos muito esta cooperação, pois somos mais praticantes do trabalho em parceria extra eclesial e não temos potenciado tanto o trabalho em conjunto dentro da Igreja. O trabalho em rede eclesial impõe-se-nos, não por um qualquer tipo de estratégia, mas no cumprimento da comunhão fraterna que somos chamados a viver como cristãos.
Felicito a escolha do tema. É muito exigente, mas inultrapassável. Estamos muito habituados a trabalhar para os pobres e pelos pobres como se eles fossem destituídos de capacidades, esquecendo que o Criador a todos concedeu talentos, segundo as suas capacidades. Não há ninguém que seja radicalmente destituído deles. Mesmo que alguma pessoa pareça não ter capacidade alguma, há um dom que nunca se perde: a dignidade. Em nome desta dignidade tudo deve ser feito pela gente mais vulnerável. Que esta Conferência faça despertar em nós, com determinação e firmeza, a vontade de incluir os pobres e excluídos na construção ou reconstrução dos seus próprios projetos de vida.
O Sr. Cardeal Omella irá falar-nos da opção preferencial pelos pobres hoje na Europa. Está é uma opção assumida pela Igreja já há muito tempo, mas que tem de a demonstrar com maior objetividade. Uma certeza eu tenho: pobres, crentes ou não, nas suas horas mais difíceis continuam a fazer a opção pela Igreja.
Durante todo o dia de hoje, iremos falar de pobres e excluídos, mas deixemo-nos imbuir da certeza de que a erradicação da pobreza, na sua dimensão absoluta, está ao alcance da Humanidade. Todavia, só se alcançará este dever se tudo fizermos pela atuação permanente, sistemática e universal nas causas da pobreza, tendendo para a sua extinção, sem descurar o esforço, também permanente, sistemático e universal, de atenuação-solução de cada situação de pobreza. O Comité do Nobel da Economia voltou a premiar economistas preocupados em colocar a economia verdadeiramente ao serviço da pessoa e da atenuação da pobreza global. Uma delas é a francesa Esther Duflo, com 46 anos de idade, que ao conhecer a escolha da sua pessoa para receber o prémio, disse: Com muita frequência, quem faz as políticas pode generalizar as pessoas em situação de pobrezas, pensando que estão completamente desesperadas ou preguiçosas, mas não entendem as causas.
Que desta Conferência surja outro impulso que vá no sentido de fomentarmos a cultura contra a indiferença ou a estigmatização da pessoa pobre. Muita gente em vez de lutar contra a pobreza, luta contra os pobres. Que connosco não seja assim.
Uma das causas que se aponta para a existência de uma taxa tão preocupante de pobreza em Portugal tem uma relação direta com os níveis de desigualdade económico-social radicados no nosso país. Muitos dizem que é necessário maior crescimento económico para superar a pobreza. A realidade não certifica isso. Sem dúvida que não é possível distribuir riqueza sem a produzir, mas a experiência diz que o problema não está no crescimento da riqueza, mas na justiça da sua distribuição. Pessoalmente penso que não basta distribuir meios financeiros. Também é necessário sabermos dar “poder aos pobres e excluídos”, isto é, dar voz ativa às pessoas em situação de qualquer forma de vulnerabilidade. Pela sua capilaridade e forma comunitária as nossas paróquias têm condição para dar este poder. Apena há que mudar mentalidades.
Para terminar, sugiro que sigamos os exemplos de dois meus grandes mestres, o Professor Alfredo Bruto da Costa e a Professora Manuela Silva a quem, pessoalmente, dedico este dia e a quem, decerto, Deus já entregou o prémio dos que sabem “guardar a fé e combater o bom combate.