Desafios da Laudato Si ao Mundo e à Igreja
Passam 5 anos que o Papa Francisco publicou um dos textos mais marcantes – arrisco a afirmar, na senda de muitos especialistas, não “um dos”, mas “o texto” – em muito do que já se opinou sobre ecologia. A Carta Encíclica «Laudato Si` Sobre o Cuidado da Casa Comum» não apresenta apenas um outro pensamento, mas um pensamento novo, marcado por inovação conceptual, por maior abrangência, por propostas de compromisso com a Natureza que não dispensa ninguém, por um estilo (como é seu timbre) facilmente entendível, por incluir a terra entre os pobres, em sentido lato. Com efeito, parece-me que a Encíclica relaciona estreitamente a exploração depradadora do planeta, à chaga da pobreza e a fatal necessidade da alteração do sistema económico-social.
Esta Carta Encíclica poderá resumir-se num objetivo: «unir toda a família humana na busca de um desenvolvimento integral e sustentável» (nº. 13), sem oprimir a «nossa terra» nem os outros «pobres mais abandonados e maltratados» (nº. 2).
Neste sentido, são inúmeros os desafios colocados por Francisco aos Estados e a cada um de nós. Refiro dois desafios para o mundo e outros tantos para a Igreja.
Para o mundo, é necessário «converter o modelo de desenvolvimento global» (194); e promover o desenvolvimento local (144). Para isso, no conjunto das propostas pontifícias, realço: «o diálogo (…) sobre o futuro do planeta» (14); e as «mudanças profundas (…)» pessoais, coletivas e estruturais (5).
Relativamente ao diálogo, o Papa lançou «um convite urgente a renovar o diálogo sobre a maneira como estamos a construir o futuro do planeta (14). Importa ter consciência de que o diálogo não pode ser conversa especulativa, mas a procura de caminhos em comum, visando as convergências possíveis através de perspetivas diferentes. Quanto às «mudanças profundas (…)» pessoais, coletivas e estruturais, a Encíclica aborda em especial as mudanças «nos estilos de vida, nos modelos de produção e de consumo e nas estruturas consolidadas de poder, que hoje regem as sociedades»(5). O Papa concretiza que «a sobriedade, vivida livre e conscientemente (…)» (223), articulada com a humildade (224) é verdadeiramente libertadora (223), na medida em que evita reduzir o bem-estar à prática egoista do desperdício (9); e é também dignificante, na medida em que não nos reduz àquilo que possuímos nem ao que dominamos. A promoção do desenvolvimento local não ficou esquecida no prnsamento de Francisco que refere o território local como o espaço humano por excelência, onde as pessoas, famílias e populações lutam pela subsistência, praticam a solidariedade básica.
Os desafios à Igreja figuram ao longo de toda a Encíclica, dado que os cristãos católicos atuam nos diferentes domínios de atividade e em todo o mundo. Esses desafios são, por um lado, a «comunhão universal» (nº. 220) e, por outro, a cultura e a prática do cuidado (229)
«Louvado sejas, meu Senhor», cantava São Francisco de Assis. Neste gracioso cântico, recordava-nos que a nossa casa comum se pode comparar ora a uma irmã, com quem partilhamos a existência, ora a uma boa mãe, que nos acolhe nos seus braços: «Louvado sejas, meu Senhor, pela nossa irmã, a mãe terra, que nos sustenta e governa e produz variados frutos com flores coloridas e verduras».
Eugénio Fonseca
Presidente da Cáritas Portuguesa