Laudato Si: “Uma só família humana, Cuidar da Criação”
A propósito da Semana Laudato Si, Mensagem do Cardeal Luis António Tagle, presidente da Caritas Internationalis
Estimados amigos Cáritas,
Em algumas partes do mundo nascem bebés, crescem crianças e adultos enfrentam o fim das suas vidas a viver e a trabalhar no lixo tóxico criado e descartado por outros. Noutras partes, pessoas vivem na corda bamba entre cheias, secas e graves injustiças. Nestes locais, a vida é estrangulada lentamente desde o princípio. Esta não é a conceção de Deus para a humanidade e para a Terra.
A vida corre tão depressa que muitas pessoas ficam desorientadas. Quanto mais depressa corre a vida, mais consumimos, mais desperdiçamos e mais nos afastamos de Deus e dos pobres. Com este superconsumo vem um peso – não apenas físico mas também espiritual. Acumulamos tantas coisas na nossa cabeça e nas nossas vidas que mais um pensamento, facto ou responsabilidade faz-nos sucumbir à letargia.
Em junho, o Papa Francisco chamou-nos a levar a cabo uma missão para salvar o planeta, a nossa relação com Deus e a nossa família humana. Ele deixou-nos um alerta para “remover o lixo das nossas vidas” e da vida dos outros, para que possamos viver como uma família humana em dignidade e unidade.
Na encíclica Laudato Si, o Santo Padre abre o caminho para um “diálogo ecológico” global. Gostaria de estender este apelo a toda a família Cáritas e convidá-los a receber nos seus corações a visão estratégica da Cáritas “Uma só Família Humana, Cuidar da Criação”.
Em Laudato Si, o Papa Francisco relembra para substituirmos o consumo com um espírito de sacrifício, a ganância com generosidade e o desperdício com um espírito de partilha. Devemos “dar, e não simplesmente desistir”. Somos chamados a libertar-nos de tudo o que é pesado, negativo e supérfluo e a entrar num diálogo com a nossa família global.
Isto requer um processo de comunicação universal e de escuta na verdade, uma examinação de consciência global, um reconhecimento global de falhas e sentimento de culpa e uma solução global para corrigir o mal que foi feito.
Precisamos de recuperar o horizonte do dom e da graça dentro do qual todas as criaturas encontram o seu lugar. Precisamos de ver a nossa vocação humana para viver com a família da criação, como guardiães e não como donos. Isto requer que sejamos energéticos, motivados e criativos, mas nunca opressores e abusivos.
Na Cáritas pude testemunhar o poder do amor ativo no trabalho, no meio desta crise ecológica global. Os colaboradores da Cáritas criam laços de solidariedade com as pessoas que vivem nas lixeiras. Eles reforçam a dignidade dos mais pobres que são fustigados pelas alterações climáticas. Os voluntários da Cáritas acompanham pessoas em todo o mundo, nos esforços para construir as suas vidas, as suas casas e enviar as suas crianças para a escola. A Cáritas é a Palavra de Deus viva nas comunidades pobres de todo o mundo. É um rio de amor e esperança que corre livremente e nos nutre, trazendo um enorme poder natural de mudança.
Como membros da Cáritas e da família humana, todos temos um papel a desempenhar nesta revolução ecológica para a qual o Papa Francisco nos convidou. Devemos fortalecer os laços dentro das nossas organizações para que possamos trabalhar melhor juntos. Através da conjugação dos nossos recursos, da partilha de informação e do apoio mútuo, podemos demonstrar que é possível às pessoas com boa vontade restabelecerem a esperança juntas.
Devemos usar todo o nosso conhecimento e experiência para encontrar iniciativas sucintas que nos vão permitir a nós e a qualquer membro da sociedade embarcar nas mudanças de estilo de vida necessárias à conversão pessoal. Devemos refletir bastante sobre como garantir que a mensagem do encíclico alcança os extremos da sociedade: os mais pobres que sofrem injustamente devido às escolhas de outras pessoas, e as elites que têm um enorme poder em relação à mudança global, mas que se afastam dessa responsabilidade.
As variadas citações das conferências episcopais ao redor do mundo no encíclico demonstram que as igrejas locais têm abordado o problema ecológico de há alguns anos para cá. Agradecemos ao Papa Francisco ter agregado estas vozes para formar um “coro” de louvor, lamento e apelo. Acredito que os líderes católicos, especialmente os bispos da Cáritas, têm um papel fundamental para garantir que as pessoas acarinham nos seus corações a mensagem do encíclico do Papa Francisco, incitando a uma espiritualidade cristã de integridade ecológica. Tal espiritualidade inclui a recuperação de uma atitude contemplativa que vê e aprecia a beleza da criação.
Precisamos de dar forma a uma espiritualidade que convide políticos, empresários, artistas, educadores, cientistas e construtores a trabalhar para o bem comum, respeitando a dignidade de cada um, especialmente dos pobres e mais vulneráveis.
O amor de Deus é a força fundamental em todas as coisas criadas. A Cáritas é uma manifestação desse amor, que traduz “aquecimento global” num aquecimento global dos nossos corações em relação aos pobres.
No amor de Cristo,
Luis Antonio Cardinal Tagle
Presidente Caritas Internationalis
Tradução: Sónia Rio