“Eu estive preso e tu me visitaste”
Não conheci o “Padre das Prisões”, mas a sua dedicação e inspiração deixam-me um enorme sentimento de RESPEITO. A imagem de olhar para o preso, aquele que por algum motivo se viu privado da sua liberdade física, do ponto de vista de nós próprios é um desafio que nos foi deixado exatamente pelo Pe. João Gonçalves, recentemente falecido e um dos principais lutadores pela dignidade do recluso em Portugal.
Nas últimas semanas, e de uma forma geral nos últimos anos, em Portugal, mas não só, tem-se falado muito sobre a prisão, sobre este ou aquele que foi preso, sobre condenações e afins. Não venho falar de casos polémicos! Nem fazer opinião de circunstância sobre este tema.
Mas preocupa-me, preocupa a muitos, que vêm na “pessoa privada de liberdade” um vulnerável que precisa de ajuda, que este tema seja abordado sempre com uma conotação de grande distanciamento. Como se de repente aquele que cometeu algum tipo de crime e por ele esteja a cumprir pena, seja enfiado num buraco fundo e todos nos limitemos a respirar de alivio como se ali terminasse a nossa responsabilidade enquanto sociedade. Mas, o preso não é só um preso. É uma pessoa e com ele traz outras pessoas – pais, mulher e marido, filhos, irmãos… pessoas que são muitas vezes presas com o preso ainda que estejam em liberdade. Depois, há os outros, os que estão na prisão e não são presos, mas são pessoas que convivem diariamente com este mundo de fragilidade. Penso, concretamente, nos guardas prisionais que são imprescindíveis nesta equação e muitas vezes esquecidos.
Recentemente tive oportunidade de participar num encontro que juntou voluntários e outros colaboradores da Pastoral Penitenciária. É tão grande esta periferia e precisa tanto do nosso empenho como sociedade. O Pe. João Gonçalves costumava dizer que qualquer um de nós pode um dia ser preso. Acho mesmo, que só quando percebermos isso, seremos capazes de entender a prisão não como as catacumbas onde escondemos os nossos erros, mas como o lugar de oportunidade. Se para tudo dizemos que “errar é humano” então também temos de saber humanizar aquele que erra. A prisão e todo o nosso sistema judicial não pode continuar a ser tratado com a superficialidade a que temos assistido por todas as vias. Ou acreditamos naquilo que fazemos ou não acreditamos. As cadeias e o sistema prisional são o espelho daquilo que nós somos, por isso, se não acreditamos na prisão como lugar de reencontro então o que queremos destes espaços?
Rita Valadas
Presidente da Cáritas Portuguesa
(Crónica emitida no domingo, 25 de julho, no espaço “A Opinião”, na TSF
Este texto e outros produzidos no âmbito do XVI Encontro Nacional de Assistentes Espirituais e Religiosos Prisionais estão disponível em Cadernos Editorial