Proteger sim … Encurralar não!
Ser União na diversidade
Encarcerados a céu aberto, expostos entre muros de arame farpado, centenas de migrantes, maioritariamente vindos do Médio Oriente e Ásia (incluindo Afeganistão e Iraque), encontram-se há vários dias na fronteira entre a Bielorrússia e a Polónia, ou seja entre a Bielorrússia e a Europa.
Para aquela fronteira têm sido enviados soldados polacos e construídas barreiras físicas para evitar que se usem “pessoas vulneráveis” para propósitos que nada têm a ver com a sua proteção. Neste momento estamos a falar de centenas de homens e mulheres e crianças, “enfarpados”, literalmente encurralados entre dois países.
A abertura e o incentivo para que os migrantes sigam num corredor para esta fronteira é desprovida de dignidade e carece de uma ação consequente que considere não só a sua dignidade, mas também, a sua integridade física e a sua segurança. Este tem sido o apelo que a Igreja tem feito nestes últimos dias: “não podemos aceitar que haja pessoas a morrer nas fronteiras da União Europeia, isso seria uma verdadeira vergonha para a Europa, não haveria mais forma de acreditar nos valores europeus.” O que se pede à Europa é que faça tudo o que está ao seu alcance para evitar mais mortes nas suas fronteiras e prestar ajuda às pessoas que estão literalmente a morrer de frio.
Quando assistimos ao acender das primeiras luzes do Natal vem-me à cabeça a imagem A imagem de uma mãe, um pai e um bebé que trilham uma longa e perigosa estrada para outro país para escapar à ira de um tirano. Esta imagem poderia ilustrar uma história, num qualquer jornal diário, de hoje. Jesus e sua família eram refugiados. Acolher o estrangeiro, aquele que procura asilo e uma passagem segura, é encontrar a história do Natal nos dias de hoje.
A história da Europa é uma história de migração. Nos últimos 2.000 anos, o “rosto” da Europa esteve sempre em mudança. Por meio de expansões, invasões e assentamentos por gauleses, gregos, romanos, tribos eslavas e germânicas, nenhuma região foi deixada intocada pelo movimento de pessoas. Parte desse movimento foi voluntária, parte por necessidade e parte forçada. Reivindicar uma abordagem excludente da identidade europeia é contra a realidade da história do continente. A força da identidade da Europa, na verdade, deriva desta mesma história de movimento – esta rica mistura de culturas e povos.
Nas páginas de abertura de Fratelli Tutti, o Papa lembra-nos os princípios fundadores da União Europeia, em que a ideia europeia se baseava na ‘capacidade de trabalhar juntos para fazer a ponte entre as divisões e promover a paz e a fraternidade entre todos os povos deste continente, Francisco sublinha que o nosso ‘nós’, o nosso senso de comunidade e unidade ‘no mundo mais amplo e dentro da Igreja, se está a alterar devido a formas míopes e agressivas de nacionalismo e de um individualismo radical’. Na verdade, aqueles que sofrem já são os mais marginalizados da sociedade. É impossível “virar a cara”
Partilho um dos motes da campanha “10 milhões de Estrelas”: “Há gestos que constroem a paz”. Eu acredito que também depende de cada um de nós e dos esforços que todos conseguirmos Unir.
Feliz domingo
Rita Valadas
Presidente da Cáritas Portuguesa
(Crónica emitida no domingo, 21 de novembro, no espaço “A Opinião”, na TSF