Resultados – Concursos MIND
Os Concursos MIND chegam agora ao fim e os mais distintos trabalhos de vários jovens ativistas são hoje divulgados, depois da apreciação da Cáritas Portuguesa e seus parceiros jurados: Alto Comissariado para as Migrações, Organização Internacional para as Migrações, Obra Católica Portuguesa de Migrações, Fundação Secretariado Nacional da Educação Cristã e KISS.
Recordamos que esta iniciativa se insere no âmbito do Projeto MIND, um projeto de sensibilização para a temática das migrações, que ao longo de três anos teve uma intervenção próxima junto de grupos alvo muito específicos, com o objetivo de promover o envolvimento da sociedade Europeia nas questões e desafios do desenvolvimento, através de uma procura de oportunidades para o diálogo e encontro entre as pessoas para que tenham um melhor entendimento sobre as ligações complexas entre as migrações, o desenvolvimento sustentável e as respostas a estas questões com base na humanidade, dignidade e respeito. Mais informações aqui.
O urgente desafio de proteger a nossa casa comum inclui a preocupação de unir toda a família humana na busca de um desenvolvimento sustentável e integral, pois sabemos que as coisas podem mudar. O Criador não nos abandona, nunca recua no seu projecto de amor, nem Se arrepende de nos ter criado. A humanidade possui ainda a capacidade de colaborar na construção da nossa casa comum.
Laudato Si, 13
RESULTADOS:
»» CONCURSO #WHATISHOME
VENCEDOR:
FINALISTAS :
(Sem ordem de classificação)
Escola: Escola E.B. 2,3 Dr. Francisco Cabrita – Equipa: Andorinhas
Escola: Escola Básica de São Domingos – Equipa: A Lã e a Neve
Escola: Escola EB 2,3 Egas Moniz
Escola: EB 2,3 Soeiro Pereira Gomes – Equipa: TMC – Todos Merecem ter uma Casa
Escola: EB 2,3 Soeiro Pereira Gomes – Equipa: BOSS_JMK
Escola: EB 2,3 Soeiro Pereira Gomes – Equipa: Equipa: Traquinas do Mundo
Escola: EB 2,3 Soeiro Pereira Gomes – Equipa: Equipa: Porta para o Conforto
Escola: EB 2,3 Soeiro Pereira Gomes – Equipa: Equipa: ACRV
Escola: EB 2,3 Soeiro Pereira Gomes – Equipa: TYRD
Escola: EB 2,3 Soeiro Pereira Gomes – Equipa: Alpha
Escola: EB 2 3 de Ceira
Campanha #WhatisHOME vencedora:
»» CONCURSO DOCUMENTÁRIO
VENCEDOR:
Documentário vencedor:
»» CONCURSO WE MIND
VENCEDORES:
Edição Artigo de Opinião
Edição Vídeo
Edição | Artigos de Opinião – Vencedores:
Ana Sofia Baptista
Título: A saúde Oral em Crianças refugiadas e/ou imigrantes: uma nova realidade
Resumo
Vivemos numa era de crescente deslocamento humano entre as diferentes regiões do globo e o cenário português não tem sido exceção. Estas migrações constituem um desafio para a saúde pública e, para a população imigrante e/ou refugiada. A diminuição da qualidade de saúde oral é um problema comum, principalmente na faixa etária pediátrica. A saúde oral depende de fatores culturais, económicos e sociais que influenciam os hábitos alimentares, bem como os de higiene. Por isso, enquanto profissionais de saúde a implementação de estratégias que visem a prevenção dos problemas inerentes à saúde oral deste grupo de risco, tem grande valor para esta população e para o país que a acolhe.
Introdução
A saúde oral das crianças imigrantes e/ou refugiadas, em busca de asilo, deve ser considerada uma área de especial foco por parte dos países que as acolhem.
De um modo geral, a saúde destas crianças tem vindo a ser um ponto de preocupação, com um esforço físico de infraestruturas, profissionais e monetárias dos países onde lhes é fornecido asilo.
O acesso a cuidados de saúde por este grupo, é considerado um desafio de saúde pública que os ministérios e entidades enfrentam. Os seus princípios assentam em garantir o direito à saúde, evitando disparidades no acesso aos cuidados, reduzir a mortalidade e morbilidade e minimizar o impacto negativo do processo de migração. Diferentes normas têm sido implementadas pela união europeia e pelos governos destes diferentes países, que unindo esforços e alterando o seu sistema interno se propuseram a auxiliar e acolher com qualidade esta população, dando especial atenção à população pediátrica1,2.
Apesar disto, é frequente existirem complicações na área da saúde, associadas à condição social inerente à cultura de cada indivíduo, como os atrasos na sua admissão em cuidados de saúde adequados, dificuldades dos profissionais de saúde no acesso a dados/história clínica e até à falta de confiança no sistema de saúde do país que integraram2.
A saúde oral tem uma influência bem demarcada na saúde de um modo geral, principalmente num indivíduo que está em franco desenvolvimento físico, psicológico e social. Isto é, uma criança com cuidados de saúde oral deficitários, a qualidade de vida também se encontra comprometida pela dor, pelas dificuldades na concentração e na aprendizagem escolar e também pela associação a algumas doenças crónicas como a diabetes ou doenças cardiovasculares.
Para além disto, a cárie dentária é uma das doenças crónicas mais prevalentes na população pediátrica e é bem conhecido o grau de incapacidade que esta pode proporcionar. Desde queixas álgicas leves a fortes, na região da cabeça e pescoço, até à limitação ou impedimento na fala, respiração ou alimentação3–5.
Assim, consideramos que a saúde oral deve ser um foco de especial atenção na população pediátrica refugiada ou imigrante.
Desenvolvimento com Argumentação
A presença de dentes limpos (sem placa bacteriana e restos alimentares), sem lesões de cárie dentária e gengivas saudáveis, são sinais que revelam uma boa saúde oral. Estes são também fortes indicadores de uma boa saúde geral, sendo por isso tão importante a promoção de saúde oral nas populações em fase de crescimento6.
Segundo o III Estudo Nacional de Prevalência das Doenças Orais (ENPDO), apresentado em Portugal no ano de 2015, o número de crianças livres de cárie, nomeadamente no grupo etário dos 6 anos (54,8%) tem vindo a aumentar, comparativamente a valores anteriores, e no grupo etário dos 12 anos o índice de CPOD ( que representa o número de dentes cariados, perdidos ou obturados), apresentava um valor de 1,167,8.
O aumento das sessões informativas nas escolas e o uso de cheques dentista, poderão ser alguns dos fatores a contribuir para estas melhorias. No entanto, Portugal ainda se encontra num crescendo, no que concerne à saúde oral pediátrica, principalmente em crianças em idade pré-escolar9,10. Apesar dos valores obtidos no III ENPDO estarem ligeiramente aquém do que foi estabelecido no Global Goals For Oral Health – até ao ano de 2020, 80% das crianças com 6 anos de idade, deverão estar livres de cárie e aos 12 anos o índice de CPOD deverá ser inferior a 1,5. Os dados epidemiológicos de 2015 são promissores para o futuro da saúde oral pediátrica em Portugal11.
Com o crescente êxodo das populações, principalmente oriundos do Afeganistão, Iraque, Síria e Eritreia, em junho de 2019, Portugal já havia recebido mais de 1800 refugiados, a maioria indivíduos menores de 18 anos. Recentemente foi anunciado pela Comissão Europeia, que Portugal irá acolher crianças não acompanhadas, oriundas de campos de refugiados da Grécia12. Pelas diferenças culturais marcadas, algumas das populações possuem hábitos alimentares diferentes dos praticados usualmente no nosso País. Desta forma, é da responsabilidade dos profissionais de saúde, incluindo o Médico Dentista/Odontopediatra, acompanhar o seu desenvolvimento e atenderem à multiculturalidade, aconselhando hábitos de vida saudável adaptados a cada indivíduo.
Os fatores culturais, económicos e sociais, influenciam os hábitos alimentares, bem como os de higiene, cujas repercussões se refletem fortemente na saúde oral. Apesar da etiologia das cáries ser multifatorial (presença de bactérias que fermentam os açúcares, baixa exposição ao flúor e hábitos de higiene oral deficitários), uma das suas principais causas é a ingestão frequente de alimentos ricos em hidratos de carbono fermentáveis13. Melhorar os conhecimentos sobre os efeitos deste tipo de alimentação para a saúde oral, dada a disponibilidade e acessibilidade destes produtos, e acompanhar a saúde oral da criança logo desde o nascimento do primeiro dente, pode fazer a diferença na saúde geral destas crianças14,15.
Alguns países europeus já evidenciaram a alta prevalência de cáries extensas e infeções com origem dentária, na população pediátrica imigrante e/ou refugiada16. Estes são dados que nos devem alertar e motivar a aplicar medidas preventivas e de cuidados de saúde oral primários, que reforcem a saúde oral principalmente nos grupos de maior risco.
Ser detentor de uma boa saúde oral não é complexo, mas implica um acompanhamento do profissional de saúde para aconselhar a dieta familiar, aplicar flúor nas consultas de cuidados de saúde oral primários, ensinar e motivar para hábitos de higiene oral corretos, cuidar traumatismos dentários, realizar precocemente consultas de saúde oral da criança, identificar e monitorizar lesões de cáries iniciais, tratar cáries mais extensas e referenciar para especialistas os tratamentos mais específicos15,17.
Investir precocemente nestas medidas, contribui para evitar futuras intervenções mais complexas, que poderão ser mais dispendiosas para o país (pela necessidade de múltiplas consultas de urgência médica e de medicamentos comparticipados), e que certamente se irão refletir negativamente no indivíduo que se encontra em plena fase de crescimento, desenvolvimento e aprendizagem.
Nos atuais momentos de pandemia, originada pelo novo vírus SARS-CoV-2, manter uma boa higiene oral, tem demonstrado estar intimamente associado à redução da carga bacteriana na cavidade oral, prevenindo infeções mais graves, potencialmente fatais em pacientes infetados com esta nova estirpe viral18. A Direção Geral da Saúde, afirma que este é um vírus que pode afetar todos os indivíduos, de todas as faixas etárias e que o grupo de imigrantes e refugiados é um dos mais vulneráveis à Covid-19. Nunca foi tão importante manter uma boa saúde oral de grupo, para além de manter os cuidados de saúde gerais e boas práticas de distanciamento social19!
Conclusão
Cuidar de quem se apresenta vulnerável, implica humildade, responsabilidade, justiça e beneficência perante quem assumimos cuidar. Em populações, famílias e crianças imigrantes é essencial apresentar medidas que visem criar relações terapêuticas desde cedo, e que permitam oferecer cuidados em saúde que sejam culturalmente adequados, tendo em contas as particularidades de cada indivíduo, personalizando os cuidados.
A prevenção das doenças orais é importante para a população pediátrica e Portugal parece estar empenhado em proporcionar às crianças e jovens, cuidados de excelência que se vão refletir nas sua vidas futuras.
O número de crianças refugiadas na Europa e em Portugal, previsivelmente irá crescer e é nosso papel enquanto profissionais de saúde, implementar estratégias que visem a prevenção dos problemas inerentes à sua saúde oral. Desta forma, crescerão indivíduos dotados de uma saúde oral que lhes permita sorrir com confiança, para um novo futuro mais promissor no país de acolhimento.
Beatriz Fardilha
O mundo desafiante
Ao refletir sobre este tema, surgiu-me a questão: o que significa para mim “casa comum”? Para além da definição de casa física, com quatro paredes e telhado, onde habitam pelo menos duas pessoas, penso que “casa comum” pode ser, justamente, o mundo, lugar em que todos nós vivemos. É esta última a definição que irei abordar, no presente texto.
Assim, vejo “casa comum” como o mundo desafiador que habitamos. Considero que as maiores adversidades deste lugar são, sobretudo, as relações que estabelecemos uns com outros, as diferenças sociais, a necessidade de cuidar e preservar esta “casa” que todos habitamos e, por último, a pandemia a que estamos a ser sujeitos nos dias de hoje e que veio tornar evidente às diferentes gerações que viver neste mundo, é um grande desafio.
- As relações sociais
O ser humano caracteriza-se pela sua complexidade, é um ser racional e social, o que nos permite assumir “que não podemos cumprir a nossa natureza sem estabelecer relações com os outros. Por outro lado, somos também seres morais, pois, por natureza, criamos normas que regulam as nossas interações, de outra forma não seria possível entendermo-nos uns com os outros” (Lóia, 2020).
As primeiras relações que estabelecemos são com a nossa família ou com aqueles que contactamos assim que nascemos. Estas relações são por norma bastante complexas e podem ser também muito diversificadas, dependo da constituição da família. Contudo, o importante é entendermos que é através destas relações, que aprendemos como devemos lidar nas interações que estabelecemos com o mundo exterior.
Nesta “casa” partilhada é, todavia, essencial que as pessoas criem laços entre si, uma vez que partilham o mesmo espaço e precisam umas das outras para conseguirem satisfazer as suas necessidades, de forma a concretizarem a sua felicidade.
Efetivamente, existem vários tipos de relações afetivas: entre familiares, como já mencionei, mas também as de amizade e as de amor. Todas estas são relevantes na vida de qualquer ser humano, pois cada uma desempenha determinada influência na sua vida e acredito que para uma pessoa se sentir “realizada”, deverá vivenciar cada uma destas relações.
Em todo o caso, é importante destacar que nem sempre é fácil estabelecermos este tipo de conexões uns com outros, na medida em que somos todos seres distintos. Cada um tem os seus interesses e desígnios, o seu contexto familiar, contudo, todos vivemos com o fim comum de alcançar um bem supremo: a felicidade. Desta forma, as nossas ações são sempre em busca do nosso bem e, por isso, muitas vezes agimos apenas a pensar na satisfação das nossas necessidades, esquecendo que vivemos confinados a esta “casa comum”, dependendo uns dos outros para atingirmos o que desejamos, pois, como os tempos atuais nos mostram, só quando todos estamos bem, preservamos o nosso bem-estar.
O facto de, por vezes, agirmos de forma egocêntrica origina os desentendimentos e conflitos que temos uns com os outros e que, desde logo, podem acarretar consequências devastadoras na vida de um indivíduo.
Deste modo, somos desafiados a estabelecer relações afáveis uns com os outros, procurando entendermo-nos e respeitar-nos, de forma a atenuar as divergências que possam existir entre as pessoas e recordando a importância de cada um, que usufrui deste espaço nas nossas vidas, pois seríamos, decerto, seres menos felizes, caso vivêssemos isolados neste mundo.
- Viver numa casa estratificada
No mundo contemporâneo são evidentes as diferenças sociais existentes nas sociedades e as adversidades que persistem, ainda, a este nível.
Na verdade, sempre existiram divergências sociais, sociedades que valorizam ricos e oprimem pobres, contudo é importante realçar a necessidade de esbater estas desigualdades, uma vez que num mundo tão desenvolvido ao nível tecnológico, é preocupante pensarmos que ainda existem diversos países considerados de “terceiro mundo”.
É minha convicção que este é um grande desafio desta “casa”, tanto para as classes mais abastadas como para as mais pobres, sendo estas últimas as que enfrentam, porventura, as maiores dificuldades sobretudo económicas e sociais.
Em relação às classes que se encontram no topo da pirâmide, penso que estas podem ser desafiadas a combater divergências sociais, pois estes indivíduos têm, pela sua posição social privilegiada, o poder de inverter a situação atual, atenuando desigualdades tão evidentes na “casa” que todos habitamos, tornando-a num espaço onde cada um desempenha um papel importante. Este desafio pode dividir-se em dois aspetos: na mudança das mentalidades e, em seguida, na forma como estas pessoas agem com os que mais necessitam.
Em primeiro lugar, penso que a alteração das mentalidades é fundamental no combate às desigualdades, na medida em que o facto de estas pessoas possuírem bens que as fazem pertencer a um estatuto superior e pensar que têm mais direitos que os outros, acaba por se repercutir em atitudes egoístas e prejudiciais àqueles que não se conseguem defender por não terem património equivalente. Deste modo, tal como nos diz o Santo Padre, “(…) requer-se uma mudança de mentalidade para redescobrir o essencial (…)” (Francisco, 2019).
Em segundo lugar, considero que a forma como agimos é muito importante quando lidamos com este tipo de situações, dado que neste mundo onde, por vezes, o ser humano não age de forma correta, aqueles que pertencem a um estatuto superior tentam usufruir da pobreza dos outros em benefício próprio.
Exemplifico: veja-se o caso da farsa de algumas associações de voluntariado que, apenas, aparentam recolher donativos para os mais necessitados, não promovendo ações eficazes de combate à erradicação da pobreza. Muitas vezes, acabam por desviar o dinheiro para contas privadas não prestam o auxílio aos mais carenciados, com os quais se comprometeram, encaminhando os donativos recolhidos das pessoas que na verdade praticam a caridade.
De igual modo, acresce referir a necessidade dos indivíduos mais abastados, deixarem de agir de forma desumana para com os mais desfavorecidos, ao ostracizá-los e humilhá-los, apenas pelo facto de estes não partilharem o seu nível social.
No que diz respeito aos indivíduos mais carenciados, penso que os desafios que enfrentam, os torna mais audazes em comparação com as pessoas de classes superiores, na medida em que as adversidades que ultrapassam se prendem com a sua sobrevivência, procuram uma maneira de conseguirem combater todas as dificuldades a que são sujeitos.
Deste modo, é imperioso que estas pessoas, se sintam integradas na sociedade e percebam que não estão sozinhas a enfrentar as diversas dificuldades. Para isto, os indivíduos do estatuto mais elevado não se devem sentir superiores, nem com o direito de instrumentalizar as classes mais carenciadas pois, nesta casa, partilhamos de igual modo o direito de habitá-la de forma digna.
- Cuidar e preservar esta casa
Nos últimos tempos, temos assistido a um desenvolvimento científico e tecnológico no mundo sem precedentes. Esta evolução, criada pelo ser humano, apesar das inúmeras vantagens que nos tem trazido, causa, também, múltiplos danos ao meio ambiente, os quais estão a ser cada vez mais notórios.
Este crescimento tecnológico, por um lado, possibilitou o aumento da produção, facilitou as deslocações tanto dos produtos como das pessoas, mas contribui, ainda, para agravar os níveis de poluição da atmosfera.
Tornámo-nos uma sociedade consumista, que cria necessidades que não existem, adquirindo o que precisa e o que não precisa. A título ilustrativo, pensemos na quantidade de roupa que adquirirmos, apenas porque gostamos de “estar na moda” e, por isso, todos os anos compramos um casaco novo, sem nos preocuparmos com os malefícios que isso implica para o planeta.
De facto, se observarmos estes gastos ao nível global, tornam-se preocupantes, o ser humano atingiu um estatuto vital que, nesta “casa” comum, é incomportável. O mundo não tem capacidade para suportar as dimensões da poluição que estamos a atingir e por esse motivo é necessário que as pessoas se consciencializem de que têm de reduzir os níveis de consumo e agir em conformidade com aquilo que é o bem para o ambiente.
Na verdade, existe um conjunto de práticas que atenuam o desgaste da ação do ser humano no mundo: a “política” dos três R-Reciclar, Reutilizar e Reduzir- ou a escolha da bicicleta ou dos transportes públicos nas deslocações, entre outras, que atenuam o desgaste da ação do ser humano, no mundo.
De facto, este é outro desafio ao qual o indivíduo está sujeito: combater os maus hábitos e adquirir novas práticas, de forma a diminuir os níveis de poluição, nesta casa que é de todos nós e, por esse motivo, não temos o direito de a danificar; pelo contrário, carecemos de cuidá-la e preservá-la para que as gerações vindouras possam ter o privilégio de conhecê-la e habitá-la como nós.
- A pandemia que nos está a afetar atualmente
Nos últimos meses, temos sidos confrontados com o maior desafio que as gerações mais recentes enfrentaram, durante a sua existência terrena. Esta pandemia, à qual o mundo inteiro está sujeito, faz-nos refletir sobre a nossa vulnerabilidade, enquanto seres humanos e perceber que, apesar do desenvolvimento científico e tecnológico, não possuímos verdadeiro controlo sobre o mundo.
Na verdade, pelo facto de ser uma adversidade a nível mundial, sabemos que todos nos encontramos em circunstâncias idênticas, com as mesmas incertezas, preocupações e medos o que faz, como José Gil referiu, com que o homem tenha “(…) a experiência da globalização. Deixou de ser abstrata (…)”, ou seja, o mundo inteiro está a combater este ser invisível que nos veio transtornar.
Quando reflito sobre este assunto, recordo-me do filme “Fora de controlo”, um cenário idêntico ao que estamos a viver atualmente. Embora neste filme o vírus fosse mais violento e a solução surja mais rápido do que aquilo que se sucede na vida real, o exemplo serve para realçar o facto de considerar que esta situação se assemelha a “uma cena de um filme”.
Todavia, é um acontecimento real que nos está a fazer experienciar um modo de vida, que até há pouco, se considerava impossível. Esta nova forma de viver tem sido um grande desafio e acredito que, apesar das tragédias que têm sucedido, devemos tentar encarar esta situação como um alerta ao ser humano, como José Gil nos diz: “(…) esta terrível experiência que estamos a viver constitui apenas uma antecipação, e um aviso, do que nos espera com as alterações climáticas (…)” (Gil,2020). Por outras palavras, devemos “parar” e refletir sobre o nosso propósito nesta “casa” e se estamos a habitá-la da forma correta.
Hoje, são nos colocadas diversas restrições como a utilização da máscara ou a imposição de limites ao número de pessoas em lugares públicos, de forma a manter o distanciamento social exigido. Este desafio de permanecermos distantes uns dos outros faz-nos, decerto, valorizar os momentos em que nos podemos reunir e passar o tempo juntos, por isso tentamos combater esta distância que nos perturba através das redes sociais para que consigamos aproximar este modo de vida o mais possível do habitual.
É importante, também, referir a questão dos profissionais que acarretam outro desafio, o de servir a sociedade, para que possam assegurar a satisfação das necessidades das pessoas em circunstâncias adversas. A título ilustrativo saliente-se o caso dos profissionais de saúde, com a relevância e responsabilidade das adversidades a que são submetidos todos os dias: as de cuidar e tentar salvar o maior número de vidas possível.
De facto, não existem palavras para descrever estes indivíduos que se dedicam a cuidar do próximo, colocando também as suas vidas em risco e lutando todos os dias contra o cansaço, para que consigam desempenhar as suas funções da melhor forma.
Acresce, ainda, referir um outro desafio que esta pandemia nos coloca: o de combater o medo que se instala na sociedade, quando nos deparamos com algo desconhecido para todos nós. É, portanto, importante mencionar a necessidade das pessoas não se deixarem imbuir no medo, que nestas situações pode ser um verdadeiro inimigo nas nossas vidas.
Assim, consciencializemo-nos da gravidade da situação e sejamos cidadãos responsáveis, que se preocupam não só com o seu bem-estar, mas também com o daqueles que os rodeiam, pois esta é uma guerra comum, na qual todos somos desafiados a mostrar, mais do que nunca, que esta é uma casa onde reina a humanidade, de forma a que o final deste combate seja idêntico ao dos filmes “e acabou tudo bem…”. É, também, um momento em que não há lugar para lutas nem marginalizações, pois esta batalha não escolhe sexo, raça, idade ou grupo social!
Paula Pimenta
Atuação da Sociedade Civil na Reinstalação de Refugiados: Patrocínio Privado
Resumo:
Desde 2015, quando a União Europeia se deparou com um aumento dos fluxos migratórios no seu território, inúmeros debates sobre a forma mais adequada de gerir a questão vieram à tona. Cinco anos depois, embora os fluxos já não se configurem como os daquele período, há ainda muitas lacunas no que diz respeito às alternativas postas em práticas. Em relação aos refugiados, muito se fala sobre a importância da divisão de responsabilidade entre os Estados do bloco europeu e o caminho apontado tem sido o da reinstalação. Países majoritariamente receptores por sua posição geográfica como Grécia e Itália tem recorrentemente clamado pela aplicação dessa medida e aumento de quotas.
No que se refere a Portugal, o país se comprometeu a receber 4500 refugiados, no entanto, entre 2015 e 2018 apenas 1866 foram trazidos ao território português, o que corresponde a pouco mais de 40% do estipulado. As hipóteses suscitadas para o não cumprimento da meta giram em torno de questões burocráticas como emissão de documentos, problemas de comunicação entre instituições e, por fim, os entraves que os refugiados encontram para se integrar de forma efetiva na sociedade portuguesa. A questão da integração é um fator chave para que os refugiados tenham acesso aos serviços básicos de educação, saúde, sejam inseridos no mercado de trabalho e contribuam para o desenvolvimento local. Inevitavelmente, o processo de integração demanda que o refugiado esteja em contato com a população local e, portanto, é relevante ampliar o espectro de análise para o papel da sociedade civil nesse processo. A abordagem da relação sociedade civil x migração nos estudos atuais geralmente se pauta na construção da opinião pública. O envolvimento de indivíduos e grupos civis na integração de refugiados e seu potencial impacto tem se configurado como um tópico em segundo plano. Dessa forma, o objetivo deste artigo é lançar luz sobre a atuação da sociedade civil focando principalmente na expansão de programas de patrocínio privado no continente europeu para, posteriormente, refletir sobre essa alternativa no contexto português.
Sociedade Civil e Refugiados: Panorama do Papel dos Voluntários
O aumento do número de requerentes de asilo e refugiados posicionou o tópico das migrações como prioritário na agenda da União Europeia. Embora no contexto regional o discurso levantado tenha sido o de solidariedade e divisão de responsabilidades, nas esferas nacionais de determinados países as medidas securitárias foram reforçadas com a justificativa de salvaguardar os territórios. Consequentemente, a imagem anti-imigração foi fortalecida. Em contraste à esta tendência, passou-se a observar um vertiginoso aumento da participação civil no acolhimento de refugiados por meio de voluntariados. Mobilizações da sociedade civil no contexto migratório não são inéditos e já puderam ser observadas em outras circunstâncias de natureza humanitária como na ocasião dos refugiados na Alemanha e Áustria em função dissolução da antiga Iugoslávia na década de 90 e dos fluxos advindos de África e Médio Oriente nos meados dos 2008 e 2013 na região sul do continente europeu (Mikaba, 2016).
No entanto, a dinâmica de voluntariados e iniciativas civis que se instalou desde 2015 apresenta novos aspectos. Se antes estavam concentradas no norte da Europa, atualmente estão disseminadas por todas as regiões. A mobilidade de voluntários também é maior hoje em dia, logo esses grupos de voluntários apresentam uma maior diversidade em termos de nacionalidades. Em locais de grande afluência migratória como nas ilhas gregas de Lesbos e Samos, este fator é ainda mais proeminente.
Outro aspecto relevante concerne às motivações para que os indivíduos se insiram de forma espontânea em atividades em prol de refugiados. A nova leva de voluntariados demonstra que, para além de questões humanitárias e religiosas de solidariedade, o descontentamento com as ações postas em práticas pelos governos nacionais nessa matéria também suscita a maior participação de voluntários em países como Hungria e Alemanha, por exemplo (Rose, 2016).
No que diz respeito ao território português, em 2015 foi criada a Plataforma de Apoio aos Refugiados (PAR), uma iniciativa que reúne diversas organizações da sociedade civil com o intuito de trazer alternativas mais eficazes para os desafios que os requerentes de asilo enfrentam. No primeiro ano após o lançamento dessa estrutura, entre 2015 e 2016, mais de 6000 voluntários foram registrados no âmbito da PAR, dos quais mais de 50% se concentram na região de Lisboa. (Comissão Europeia, 2016). O pouco enfoque dado à investigação da atuação da sociedade civil na integração de refugiados resulta na rara atualização dos dados referentes ao tópico.
No entanto, na tentativa de aproveitar o potencial dos recursos sociais e materiais trazidos pelos voluntários, alguns Estados europeus vislumbraram no sistema de Patrocínio Privado uma alternativa para fortalecer o engajamento de comunidades locais no acolhimento de refugiados.
Origem do Patrocínio Privado
O modelo de Patrocínio Privado (PP), ou Private Sponsorship, teve origem no Canadá em 1979. O país, cuja história é fortemente permeada pelo aspecto migratório, apenas em 1969 ratificou a Convenção Relativa aos Refugiados das Nações Unidas de 1951. Antes disso, nos anos 50, a sociedade civil através de famílias, grupos religiosos e organizações não governamentais já desempenhava um proeminente papel de ativismo em busca de respostas mais assertivas para os migrantes e refugiados que ingressavam em território canadiano (Epp, 2017).
No entanto, até meados dos anos 70, o Canadá acolhia majoritariamente refugiados de origem europeia. Outro fator decisivo era a questão ideológica. Sob o contexto da Guerra Fria, o posicionamento político era determinante no processo decisório dos refugiados aceitos. Foi nessa circunstância que, as igrejas e entidades religiosas do Canadá passaram a pressionar o governo para permitir a entrada de grupos específicos. Dessa forma, após o golpe de Estado no Chile em 1973, o governo canadiano autorizou o ingresso de cerca de 10 mil refugiados chilenos perseguidos pela ditadura (Pfrimmer, 2019).
A legislação do país sofreu alterações em 1976 com a aprovação do Immigration Act. Com este documento, o sistema legislativo do Canadá passou a distinguir oficialmente as categorias de refugiados e imigrantes. Além disso, delineou as diretrizes da política canadiana para a questão migratória e consolidou o compromisso do país enquanto signatário da Convenção de 51 já que anteriormente a admissão de refugiados era realizada em caráter ad hoc (Epp, 2017). O Immigration Act também sancionou o Patrocínio Privado, e o sistema foi iniciado em 1979. Entre o final dos anos 70 e início dos anos 80, a guerra da Indochina suscitou a fuga de milhões de pessoas do Sudoeste Asiático. Sob este panorama, o Canadá pôs em prática o programa de Patrocínio Privado. Os primeiros grupos a serem incorporados no modelo foram de refugiados provenientes do Vietnã, Camboja e Laos. A resposta da sociedade civil ao programa foi positiva e o Canadá tornou-se à época o país com a maior taxa de reinstalação de refugiados do Sudoeste Asiático per capita. No período de dois anos, o Canadá acolheu cerca de 60 mil refugiados asiáticos, dos quais cerca de 50% foram admitidos através do Patrocínio Privado (Epp, 2017).
E no que consiste o programa de Patrocínio Privado canadiano? Em poucas palavras, o modelo permite que grupos não governamentais acolham indivíduos ou famílias em situação de refúgio. Apesar de majoritariamente exercido por organizações religiosas e esportivas, grupos de mais de cinco cidadãos canadianos ou residentes podem candidatar-se para a função de patrocinadores. O suporte, que abrange desde questões linguísticas até o apoio financeiro, deve ser provido por pelo menos um ano ou até que adquiram autonomia financeira e social. Dentre as principais responsabilidades estão promover a orientação dos refugiados com relação a serviços rotineiros como banco, transportes; ajuda para procura de emprego, matrícula escolar de crianças, acesso ao sistema de saúde e à moradia.
Os parâmetros de seleção são administrados pelo governo canadiano através do Centro de Operações de Reinstalação de Ottawa (ROC-O). Os refugiados devem possuir o status tal qual determinado pela Convenção de 51 das Nações Unidas ou pelo país em que buscou asilo anteriormente. Ambos patrocinadores bem como refugiados são submetidos a um processo de entrevista. Os refugiados passam também por exames médicos, revisão de antecedentes criminais e a decisão final fica a cargo do ROC-O.
Patrocínio Privado na União Europeia
Se antes a responsabilidade da reinstalação de refugiados na União Europeia era vista como função exclusiva dos Estados, com os maiores fluxos de requerentes de asilo nos anos de 2014 e 2015, iniciativas piloto da sociedade civil incorporaram aspectos do modelo de patrocínio privado. Por ainda se tratar de um sistema em fase de desenvolvimento no continente europeu, não há ainda unicidade na definição de patrocínio privado na região, buscando basear-se majoritariamente no modelo canadiano. Como consequência, as ações postas em práticas na União Europeia se diferenciam enquanto aos processos aplicados. Em comum, têm como base o fato de utilizarem meios privados para a reinstalação de refugiados e a cooperação com órgãos governamentais para identificação e aprovação dos indivíduos/famílias selecionados.
França e Itália, por exemplo, optaram por acolher os refugiados através dos chamados Corredores Humanitários. Uma coalizão de igrejas italianas assinou um acordo com o Ministérios de Interior e Relações Exteriores do país para a autorização de 1000 transferências de refugiados sírios provenientes principalmente do Líbano. Esse programa vigorou entre 2016 e 2018 e teve a colaboração do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) no processo de seleção. A duração do patrocínio bem como valores de financiamento ficaram a cargo de cada instituição.
Semelhante ao modelo italiano, a França também adotou o modelo de Patrocínio Privado por meio de instituições religiosas para o recebimento de 500 requerentes de asilo. Também em acordo com os Ministérios de Relações Exteriores e Interior, optou-se por conceder aos selecionados o Visto D, um visto de longa estadia que permite a requisição de asilo ao ingressar na França, geralmente em cidades menores. Os indivíduos beneficiados pelo programa de corredor humanitário não são autorizados a trabalhar até que adquiram o status de refúgio. O programa teve curta duração, apenas de 2017 a 2018. (ERN, 2017)
No caso da Alemanha, o programa de admissão de refugiados de caráter privado foi primeiro implementado por meio de familiares. Nesse modelo, a reunificação familiar ocorre através do patrocínio privado de parentes ou pessoas que tenham alguma ligação com o refugiado localizado em outro país. Com a exceção de cuidados médicos, o responsável deve se comprometer a arcar com os custos financeiros por pelo menos 5 anos. O refugiado ingressa no território alemão por meio de visto humanitário e tem direito à permissão de residência por 2 anos sendo passível de renovação. Os custos são definidos pelas autoridades regionais participantes e o sistema ainda se encontra em vigência (ERN, 2017).
Recentemente, um outro modelo vem sendo aplicado na Alemanha. Desde 2019, o programa NesT aproxima-se mais do programa canadiano. Implementado pelo BAMF, o órgão federal alemão para migrantes e refugiados, o NesT tem como objetivo proporcionar uma estrutura institucional para que grupos e indivíduos da sociedade civil se engajem no processo de integração de refugiados. Assim como no Canadá, esta nova plataforma alemã considera a participação de grupos de cidadãos com mais de 5 pessoas além das parcerias com instituições religiosas e esportivas. Um ponto importante a se destacar dessa iniciativa é a disponibilização de um curso de capacitação e treinamento para quem se candidata ao programa, sendo inclusive um requerimento necessário para se tornar um mentor, como é denominado no regulamento. O objetivo é receber 500 refugiados localizados em países como Egito, Etiópia, Jordânia e Líbano. No entanto, não há maiores informações sobre a temporalidade desse programa. (BAMF, 2019).
Outro país que aderiu recentemente ao esquema de Patrocínio Privado foi a Espanha, em 2019, na região Basca. Para tanto, a autoridade local contou com o auxílio de organismos religiosos como Jesuítas e a Caritas. Através deles, grupos de 6 a 8 pessoas foram formados para acompanhar um indivíduo e/ou família em situação de refúgio. O suporte administrativo e de capacitação também é feito por essas instituições. Em 2019, 29 refugiados da Síria foram custodiados através do programa piloto espanhol. O governo local se comprometeu em disponibilizar um assistente social por família enquanto as organizações se encarregaram do alojamento e outros gastos. Embora se vislumbre a expansão do programa, não foi estabelecido um plano para acolhimentos posteriores aos de 2019 (Manzanedo, 2019). Com exceção do caso espanhol, todos os modelos referidos acima não estão incluídos nas quotas e são complementares aos programas de reinstalação nacionais.
Patrocínio Privado de Refugiados em Portugal: Contexto Atual
O processo de acolhimento e integração de refugiados em Portugal é intensamente apoiado na atuação da sociedade civil. Por ser uma realidade muito recente no contexto português, ainda se faz notória a ausência de uma estrutura estatal adequada para suprir as demandas dessa população e é exatamente nessa circunstância em que as organizações não governamentais e cidadãos tornam-se um pilar nessa dinâmica.
Ainda assim, do ponto de vista da formulação de políticas a relevância desse setor é desconsiderada. O Plano Estratégico para as Migrações, por exemplo, inclui em torno de noventa organizações na gestão dos programas de integração existentes nas instituições públicas e ministérios, porém deixa de lado as organizações de caráter privado e/ou sociedade civil. (Caritas, 2019). Este fato se traduz até o momento na falta de uma iniciativa de Patrocínio Privado tal como vistos em outros países do bloco europeu. As ações que mais se aproximam desses moldes no território português ainda se afastam bastante da ideia de cooperação entre sociedade civil e esfera governamental.
Uma dessas iniciativas é o Projeto LAR. Fundada por uma jovem envolvida em questões humanitárias, este programa desenvolvido na aldeia de Ima, em Guarda, visa reformar casas para alojar famílias refugiadas além de prover meios para atividades laborais agrícolas. Entre os principais parceiros estão outras organizações não governamentais como supermercado, igrejas e plataformas de ensino (Monteiro, 2020)
Assim como este projeto, diversos outros programas são planejados e postos em práticas quase que exclusivamente pela sociedade civil.
Desafios e Oportunidades
Embora se configure como potencial alternativa para a integração de refugiados, o modelo de Patrocínio Privado também apresenta desafios para que seja considerado uma ferramenta eficaz. Por ser um fenômeno relativamente recente no contexto da União Europeia e empregado usualmente de maneira temporária, não há dados consolidados para refletir sobre as performances desses programas e identificar as respectivas dificuldades e avanços. Soma-se a isso a falta de conformidade de definições e direcionamentos da prática europeia. Entretanto, a análise da experiência canadiana pode ser um atalho para o delineamento de programas de Patrocínio Privados que tenham capacidade de lidar com os principais desafios de forma efetiva.
O primeiro entrave concerne a transferência de responsabilidade. Embora utilize o meio privado como principal fator para integração, a estrutura governamental não pode ser eximida de suas funções. O papel da sociedade civil deve ser visto como elemento complementar e não de substituição ao Estado. Dessa forma, é desejável que os órgãos governamentais atuem de forma proativa com recursos humanos e financeiros para a capacitação das pessoas que atuarão como mentores nesse processo. Além do mais, é desejável que os refugiados alocados por meio de Patrocínio Privado sejam, diferentemente do caso espanhol, contabilizados fora das cotas estipuladas pelos programas de reinstalação.
A falta de treinamento adequado pode incorrer em dificuldades na relação entre quem auxilia e os refugiados. Questões de diferenças culturais e preparação psicológica para lidar com pessoas em situações de vulnerabilidade são essenciais para o desenvolvimento desse tipo de prática. Ademais, comportamentos paternalistas podem criar situações de dependência estrutural e inviabilizar o processo de autonomia do refugiado.
Por outro lado, a inserção da sociedade civil pode aportar diversas contribuições. Por ser uma forma de aproximar a sociedade desses migrantes, aumenta-se a possibilidade de quebra de estereótipos e a diminuição de isolamento daqueles que ingressam no país. O desenvolvimento de programas de Patrocínio Privado em localidades menores pode também colaborar para melhorar a gestão do fenômeno de centralização que ocorre em determinadas cidades, provendo o acesso a serviços geralmente confinados aos grandes centros urbanos. Em tempos de crise como a que vivemos atualmente diante de uma pandemia global, o papel da sociedade civil mostra-se muitas vezes mais ágil em alcançar as pessoas em situação de vulnerabilidade.
Portugal cada vez mais busca exercer uma participação contundente no recebimento de refugiados. Atualmente, os acordos firmados com a Grécia têm consolidado a transferência de menores desacompanhados ao Estado português. Nesse contexto, a configuração das políticas públicas deve dedicar maior atenção ao envolvimento da sociedade civil em Portugal como um valioso aspecto para a inclusão de novos indivíduos e culturas.
Saliu Djau
Migrações: que respostas?
Resumo
A questão das migrações tem ocupado um lugar cimeiro na agenda internacional, nos meios de comunicação social, e uma grande influência na definição das políticas públicas direcionadas a encontrar respostas através de medidas operacionalizadas por organismos com mandatos para tal. Este texto pretende explorar como algumas organizações, nomeadamente UE e ACNUR, respondem às questões das migrações, assim como o papel das ONGs e a relação destas com as organizações internacionais. Os migrantes que vêm a Europa vêm para retirar emprego e destruir a cultura europeia? O texto explora algumas das ideias populares e a influência que podem ter na formulação das políticas públicas.
Sempre fez parte da história da humanidade o ato de se deslocar de um lado para o outro, a que chamamos de migração. Os motivo da migração são vários e as rotas também variam dependendo das circunstâncias. Historicamente, as pessoas migram de forma forçada ou voluntária por motivos económicos, em busco de melhores condições económicas, motivos culturais e religiosos, ir ao encontro de regiões com a maior afinidade cultural e religiosa, motivos políticos e sociais, como guerras, conflitos ou perseguições, motivos naturais, como desastres e situações climáticas desfavoráveis.
A nova ordem mundial trouxe novas rotas e fluxos migratórios à medida que o mundo se torna mais conectado e países interdependentes, devido ao fenômeno da globalização. Mas também surgiram novos atores internacionais, fugindo da tradição clássica em que os Estados eram os únicos atores no sistema internacional, por exemplo, ONGs dedicadas às questões da migração.
A nossa história recente foi marcada pelo surgimento de fluxo migratórios forçados devido a surgimento de conflitos e crises humanitárias em várias regiões do mundo. Algumas organizações e Estados consertam políticas para responder às questões associadas a migrações.
ACNUR-Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), organismo criado em 1950, na sequência da Segunda Guerra Mundial, para responder à crise de refugiados na Europa que foram afetados pela guerra. ACNUR, que inicialmente, tinha um mandato de 3 anos e apenas dentro do espaço europeu, alargou o seu mandato para fora das fronteira europeias em 1967, reformando a Convenção de 1951, o que lhe permitiu fazer chegar a assistência a mais afetados pela Guerra.
A missão de ACNUR é oferecer proteção a refugiados, ou seja, pessoas que se viram obrigadas a deslocarem-se dos seus países por terem as suas vidas ameaçadas. ACNUR atribui estatuto de refugiado a pessoas, de acordo com a definição do artigo 1º da Convenção Sobre o Estatuto de Refugiados de 1951, que “ temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país, ou que, se não tem nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha sua residência habitual em conseqüência de tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido temor, não quer voltar a ele”.
Para o acolhimento, ACNUR conta com a colaboração e apoio de estados partes. Em consequência das crises humanitárias, ACNUR criou também a noção de person of concern, no sentido de abranger e alargar o conceito a pessoas que não estão incluídas na definição clássica.
Apesar do esforço de ACNUR em adaptar-se às novas crises que têm surgido nos últimos tempos, revendo os seus conceitos e criando novas formas de responder, continua a enfrentar séries de dificuldades: O Aumento de número de deslocados internos, em contraste com a redução de número de refugiados, é um dos grandes desafios, por essas pessoas não se enquadrarem na definição de “refugiado” por se permanecerem dentro das fronteiras do país, muitos devido a conflitos internos que envolvem vários atores, o que limita a capacidade de resposta de ACNUR. Esses conflitos não convencionais violam direitos civis, não obedecem os direitos humanos nem o direito humanitário, ou o direito aplicado à guerra à luz do direito internacional, como por exemplo, os conflitos no Sudão, Congo, República Centro Africana; O aumento irregular de movimentos migratórios mistos, em maioria dos casos, com destino a países desenvolvidos, onde se verifica também grande dificuldade em distinguir migrantes económicos dos refugiados que podem ter direito a asilo; Na sua relação com os Estados, ACNUR também enfrente dificuldades na medida em que estes adotam políticas restritivas sob influências da opinião pública e da ideia de “ eles vêm roubar os nossos empregos”, “ mudar a nossa forma de viver”, também alimentada pela comunicação social; Garantir a segurança física dos refugiados e dos agentes humanitários constitui grande desafio devido ao crescente discurso de ódio e agressivo; ACNUR ainda precisa de encontrar formas mais criativas de manter os Estados a bordo e também de se reformar internamente no sentido de poder ter mais capacidade de resposta face a desafios cada vez mais complexos.
UE- União Europeia
É certo que muitos dos fluxos migratórios são com destino a países mais desenvolvidos, seja por motivos puramente econômicos ou por motivos de força maior, e a maioria segue o rumo à Europa. Essa tendência colocou a Europa no centro das pressões migratórias, com conflitos militares instalados em várias regiões, no médio oriente, por exemplo, conflitos no Iraque e no Afeganistão, o que resultou numa desestabilização da região e causou milhões de refugiados e deslocados. A situação tornou-se ainda mais grave e complexa com a ascensão de movimentos terroristas e com o conflito na Síria, na sequência da primavera árabe, que posteriormente se transformou num jogo geopolítico, envolvendo potências globais. Em 2015, as crises migratórias atingiram níveis que obrigaram a UE a adotar novas medidas de resposta.
Mas como é que a Europa responde às várias rotas? Ora, Para o fluxo que segue a rota do mediterrâneo oriental, que é a travessia marítima entre Turquia e Grécia e que se tornou sobrecarregada devido ao conflito na Síria, a UE estreitou relações de cooperação com a Turquia em março de 2016, financiando esse país para reforçar a sua capacidade de controlo das suas fronteiras ao mesmo tempo que faz chegar ajuda da UE aos refugiados de forma que estes possam sobreviver no território turco sem ter que arriscar as suas vidas para entrar na Europa.
A Rota do Mediterrâneo Ocidental, é o fluxo de migrantes da África subsariana e da África do norte que passam pelo Marrocos com destino à Europa. Como é natural, a UE reforçou cooperação com Marrocos, investindo e ajudante esse país do norte de África a melhorar a sua capacidade de resposta aos fluxos e consequentes crises, e de controlo das sua fronteiras. Em resultado ajudou a diminuir o número de migrantes ilegais nessa rota, assim como o tráfico de pessoas e de passagem de migrantes.
Talvez a mais desafiante rota de migração de pessoas pelo norte de África seja a rota do mediterrâneo central. O complexo fluxo de migrantes da África subsariana e do norte de África que passam pela Líbia com destino à Europa. Ora, a resposta a essa rota é particularmente complexa devido à situação caótica que se instalou na Líbia na sequência do conflito que derrubou o Muammar Gaddafi que permitiu o surgimento de várias milícias e facções, tornando Líbia num país profundamente dividido e sem governo central.
No que toca a outro fluxos dentro do quadro legal, a UE adotou séries de medidas para responder à migração com destino à Europa, medidas também que servem para desencorajar a migração ilegal. Nomeadamente, o reagrupamento familiar, uma medida que permite que familiares de pessoas residentes na UE possam se juntar a elas, promovendo assim a integração de nacionais de países terceiros na sociedade europeia. Outras medidas compreendem a facilitação de entrada legal no território europeu de estudantes e investigadores, trabalhadores sazonais, mobilidade dentro de empresas e concessão de asilo através do sistema Comum Europeu de Asilo.
Apesar do esforço comum da UE em tentar sempre encontrar respostas às crises e fluxos migratórios ao longo do tempo, enfrenta a maior dificuldade no sentido de conseguir ter todos os Estados membros em linha com as medidas adotadas. Isto porque, o Estados membros continuam a ter soberania sobre as suas fronteiras, apesar da delegação parcial das suas soberanias, ato inerente à participação na União. Outro fator que dificulta a resposta eficaz, é a crescente xenofobia e nacionalismos que estão a surgir em determinados países da Europa, muitos deles fazem parte das rotas de entrada de migrantes e refugiados.
Humanitarismo como resposta
Os conceitos de humanitarismo e da assistência ganharam terreno no ambiente internacional na sequência do ambiente gerado por vários conflitos que envolveram diversas nações e grupos, de onde sempre, resulta de inúmeras mortes de civis e militares e de grandes danos materiais. Em 1863 nasceu o Comité Internacional da Cruz Vermelha pelas mão de Henry Dunant, marcado pelas terríveis consequências da Guerra de Solferino. A primeira Guerra Mundial e o ambiente gerado por ela assentou mais ainda essa necessidade de prestar ajuda com base nos princípios da humanidade, imparcialidade, neutralidade e independência.
O Ambiente internacional nunca parou de se transformar. Depois do fim da Guerra Fria, que seguiu a Segunda Guerra Mundial, surgiram novos Estados, novos atores internacionais, organizações internacionais e organizações não governamentais, assim como novos conflitos. o humanitarismo também ganhou uma nova dimensão e relevância, fazendo parte da agenda de muitas organizações e Estados.
Mas como é que os Estados abraçam esta agenda de assistência e de humanitarismo sendo eles mesmos os fazedores das guerras? Ora, muitos deles fazem jogo duplo e vivem na contradição. “Uma mão que fere, a outra que socorre”, como bem iluminou o Michel Agier, na entrada do seu artigo “ Refugiados diante da nova ordem mundial”. Agier como exemplo, explora a campanha dos Estados Unidos no Afeganistão e no Iraque, 2001 e 2003, respectivamente, onde foram responsáveis por gerar milhões de refugiados, deslocados e danos materiais brutais, num conflito conduzido por eles. ao mesmo tempo que faziam o esforço bélico, desempenhavam campanhas humanitárias. o usos do humanitarismo como a mão esquerda do império.
Hoje muitos Estados recorrem ao humanitarismo e ajudas como forma de reparar as suas imagens. Até empresas recorrer a algumas formas de ação social para lavar as suas imagens face a implicações em situações questionáveis.
A UE abraça a agenda humanitária e afirma-se como um dos maiores doadores de ajuda humanitária. Em 1992 criou-se ECHO, instituição responsável pela ajuda de emergência às vítimas de crises humanitárias resultantes de catástrofes naturais ou de conflitos armados fora da União Europeia. ECHO recorrer a atores humanitários no terreno, ONG´s, para a operacionalização da ajuda e fazê-la chegar às vítimas, sendo ECHO responsável pela implementação estratégica e de escrutínio das organizações que beneficiam dos fundos europeus.
Com todos os esforços feitos pelas instituições públicas e privadas, organizações internacionais e organizações não governamentais, é evidente a nova ordem mundial obriga-nos a repensar as políticas de resposta a distribuição de poder no campo internacional e na definição de respostas.
Comecemos pela desconstrução dos discurso de ódio sem fundamentos contra os migrantes que cada vez ganha terreno na Europa. Isso é importante porque a opinião pública acaba por influenciar as políticas. As pessoas tendem a subestimar o número de migrantes na Europa, talvez pelas coberturas midiáticas, a ideia de “invasão” de “desembarques em navios” e, ainda, segundo dados do Observatório das Migrações do Alto Comissariado para as Migrações de Portugal ( ACM), em 2017, 76% de europeus consideram que há tantos ou mais migrantes irregulares que regulares na Europa, enquanto a UE estimava que apenas 5% dos migrantes seriam irregulares.
Muitos europeus afirmam que os migrantes vêm retirar empregos ou depender do sistema de segurança social. Afirmações falsas, porque quem trabalha não depende da segurança social, mas sim, contribui para a segurança social. A verdade é que, os migrantes, por não terem opções, sujeitam-se a fazer atividades laborais que os cidadãos europeus não querem fazer, por tanto, não estão a retirar emprego aos europeus, mas sim, a contribuir para o funcionamento da economia. Atividades essas que muitas vezes são consideradas perigosas, sujas e difíceis, como as áreas da construção civil, extrações, limpezas, vendas e assistentes de restauração. E mais, os migrantes empreendem e geram empregos. Os migrantes ajudam a desenvolver o país de acolhimento, ao mesmo tempo que contribuem no desenvolvimento do país de origem através de investimentos ou de envio de remessas aos familiares.
Portanto, deixar claro que os migrantes não são uma ameaça à Europa e encará-los como mais valia para a dinâmica económica e social, é meio caminho andado para a definição de políticas de resposta eficazes e inclusivas.
Em 2011, Philippe Régnier explora o conceito de diplomacia humanitária no seu artigo publicado na revista International Review Of the Red Cross. O Emergente conceito de diplomacia humanitária é a abordagem da forma como as organizações humanitárias estão a procurar adaptar-se ao novo mundo. Na prática, as organizações como a Cruz Vermelha, recorrem a metodologias diplomáticas e de negociações para fazerem chegar ajuda aos necessitados. De notar que a diplomacia, numa perspectiva clássica, do direito internacional, é reservada aos Estados soberanos que se reconhecem mutuamente e às organizações internacionais por eles formados.
A diplomacia humanitária, ou seja, a capacidade das organizações humanitárias usarem métodos diplomáticos ao nível dos Estados, pode ser uma forma de ajudar na facilitação de ajuda humanitária, tendo em conta a complexidade do sistema internacional face à nova ordem. Seria vantajoso acolher e dar espaço à essa nova forma de diplomacia na medida em que os agentes humanitários podem ser mais eficientes na negociação e fazer chegar ajuda a pessoas em situação de crise humanitária, por exemplo, em ambientes de conflitos complexos com múltiplos atores não estatais. A vantagem dos agentes humanitários nesse processo advém do facto de serem imparciais, sem agenda política e sem representarem interesses de Estado nenhum. Claro que há sempre a tentativa de usar organizações humanitárias por parte de alguns Estados para veicular as suas influências, mas dar mais capacidade às organizações perante o direito internacional ajuda-as a se tornarem mais independentes e neutras.
Edição | Vídeo – Vencedora:
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